O dia-a-dia de algumas crianças pobres: elas têm idade de crianças e obrigações de adultos. Depois dos cinco anos de idade, os meninos são presenteados com uma enxada amolada: vão à roça limpar o mato atrevido, que impede o crescimento da lavoura, onde passearão pelas ruas do milharal, alisando os cabelos das bonecas de milho. No mês de junho, no adolescer das espigas, é quando eles ousam despi-las, em ritual de colheita, não de núpcias: deitam-nas no leito quente das fogueiras, aquecendo-as, embelezando-as para festa de São João.
À tarde, amparados pelas sombras, tiram uma madorna sobre o chão forrado com bisacos de estopa, comem rapadura de engenho (água na jarra), fazem os mimos derradeiros aos caules e voltam com feixes de rama: os bichos também choram... Outros são sentinelas em carvoeiras, olarias (alarmam incêndios) e no inverno estreiam novos galões de zinco.
As ir(mães) não dão o peito, mas dão colo, mamadeira de leite morno, mingau, trocam frauda e balançam rede... "Eles são filhos de criação dos irmãos mais velhos", dizem os mais próximos. Essas meninas nem brincam de casinha, porque já têm a casa imensa e seus afazeres... Algumas brincam "de bonecas" na normalidade da infância, mas todas imaginam um lar: improvisam móveis, acendem fogo (trempes de água a ferver) e batizam os brinquedos.
Mamulengos, bruxas de pano, bonecas e sabugos de milho, formam a família imaginária: esses estranhos vizinhos são nomeados parentes.
E vão adquirindo uma visão maternal, têm uma forte tendência ao casamento prematuro: o desejo de serem mães é um projeto que cedo se inaugura.
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